Alterações ao Regime Jurídico do Teletrabalho
Tema em foco 07 Dezembro 2021
Lei n.º 83/2021, de 6 de dezembro
Atendendo à situação epidemiológica atual e à recente recomendação do Governo com o objetivo de promover o recurso ao teletrabalho, a Lei n.º 83/2021, de 6 de dezembro, veio alterar o regime do teletrabalho, bem como o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais.
Nessa medida, define teletrabalho como a prestação de trabalho em regime de subordinação jurídica do trabalhador a um empregador, em local não determinado por este, através do recurso a tecnologias de informação e comunicação.
Prevê-se, agora, que a matéria relativa ao teletrabalho possa ser regulada por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, desde que esse novo tratamento seja mais favorável para os trabalhadores quando comparado com as normas legais reguladoras do contrato de trabalho.
A sujeição de um trabalhador ao regime de teletrabalho está dependente da celebração de um acordo escrito que poderá constar do contrato de trabalho inicial ou de um documento autónomo face a este último.
O acordo deverá conter:
a) A identificação, assinatura e domicílio/sede das partes;
b) O local em que o trabalhador realizará habitualmente o seu trabalho (e que poderá ser alterado, por escrito, a pedido do trabalhador);
c) O período normal do trabalho diário e semanal;
d) O horário de trabalho;
e) A atividade contratada e a categoria correspondente;
f) A retribuição do trabalhador (incluindo as prestações complementares e acessórias);
g) A propriedade dos instrumentos de trabalho e aquele que se responsabilizará pela sua instalação e manutenção;
h) A periodicidade e o modo de concretização dos contactos presenciais.
O recurso ao teletrabalho pode surgir mediante proposta do trabalhador ou do empregador. Se a proposta partir do empregador, o trabalhador pode opor-se sem necessidade de fundamentação, sendo certo que tal recusa não pode constituir causa de despedimento ou fundamento para aplicação de sanções. Partindo a proposta do trabalhador, a recusa pela entidade patronal deverá ser realizada por escrito e mediante fundamentação.
No que respeita à duração do acordo, prevê-se a possibilidade de celebração com duração determinada que não pode exceder 6 meses e que se renovará automaticamente por iguais períodos, exceto se alguma das partes declarar, por escrito e até 15 dias antes do seu término, que se opõe à renovação. Poderá ainda optar-se por um acordo de duração indeterminada que cessará mediante comunicação escrita de qualquer das partes e que produzirá efeitos 60 dias após tal comunicação.
Mantém-se a possibilidade de denúncia do acordo durante os primeiros 30 dias da sua execução.
Nos casos de contrato de trabalho com duração indeterminada ou nos casos em que o termo não tenha sido atingido, após cessar o acordo de teletrabalho, deverá o trabalhador retomar a atividade em regime presencial, sem ver prejudicada a sua categoria, antiguidade e quaisquer outros direitos que lhe sejam reconhecidos.
Relativamente aos equipamentos e sistemas a utilizar pelo trabalhador em regime de teletrabalho:
a) O empregador é o responsável pela sua disponibilização;
b) Deve o acordo de teletrabalho especificar se esses equipamentos serão fornecidos diretamente pela entidade empregadora ou se serão adquiridos pelo trabalhador após concordância do empregador face às características e preços dos bens a adquirir;
c) Deve o empregador compensar integral e imediatamente as despesas adicionais que o trabalhador, comprovadamente, tenha que suportar como direta consequência da aquisição ou uso dos equipamentos necessários à realização do trabalho (onde se incluem: acréscimos de custos de energia e de velocidade da rede, bem como os custos da manutenção dos equipamentos);
d) Esta compensação pelas despesas adicionais com os equipamentos não pode ser considerada, para efeitos fiscais, como rendimento do trabalhador;
e) Sempre que os equipamentos sejam fornecidos pelo empregador, as condições de uso dos mesmos para além das necessidades de serviço deverão estar previstas num regulamento interno que a entidade empregadora deverá definir e publicitar (sempre com observância do Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados) e onde deverão constar também os termos em que o teletrabalho será aceite nessa mesma empresa.
Mantêm-se as exigências de respeito pela privacidade do trabalhador, sendo que, sempre que o teletrabalho seja prestado no domicílio deste último, a visita a esse local depende de aviso prévio de 24 horas, da concordância e presença física do trabalhador e só deverá ter por objeto o controlo da atividade laboral e dos instrumentos de trabalho (constituindo a violação destas exigências contraordenação grave). Acresce que está vedada a captura e utilização de imagem, de som, de escrita, de histórico, ou o recurso a outros meios de controlo que possam afetar o direito à privacidade do trabalhador, sob pena de contraordenação muito grave.
Prevê-se que o trabalhador em regime de teletrabalho mantém os mesmos direitos e deveres dos demais trabalhadores da empresa com categoria ou função idênticas, nomeadamente face à formação, promoção na carreira, limites de duração do trabalho, períodos de descanso, férias pagas, proteção da saúde e segurança no trabalho, reparação de acidentes de trabalho e doenças profissionais e acesso a informação das estruturas representativas dos trabalhadores.
O trabalhador terá ainda os seguintes direitos:
a) Receber, no mínimo, a remuneração que auferiria em regime presencial;
b) Participar presencialmente em reuniões que ocorram nas instalações da empresa mediante convocação das comissões sindicais, intersindicais ou de trabalhadores;
c) Integrar o número de trabalhadores da empresa para efeitos de estruturas de representação coletiva.
São deveres especiais do empregador:
a) Manter o trabalhador informado quanto às características e modos de utilização dos dispositivos de trabalho à distância;
b) Abster-se de contactar o trabalhador no período de descanso;
c) Adotar medidas para evitar o isolamento do trabalhador, promovendo pontuais contactos presenciais;
d) Garantir ou custear as ações de manutenção e de correção de avarias nos equipamentos utilizados no teletrabalho;
e) Consultar, por escrito, o trabalhador antes de introduzir mudanças nos equipamentos;
f) Facultar, se necessário, formação ao trabalhador para o uso adequado nos equipamentos por este utilizados no teletrabalho.
São deveres especiais do trabalhador em regime de teletrabalho:
a) Informar atempadamente a empresa de avarias ou defeitos no funcionamento dos equipamentos;
b) Cumprir as instruções do empregador quanto à segurança da informação utilizada ou produzida no exercício da atividade;
c) Respeitar as restrições que o empregador tenha definido quanto ao uso para fins pessoais dos equipamentos por ele fornecidos;
d) Observar as diretrizes do empregador em matérias de saúde e segurança no trabalho.
É concedido ao trabalhador o direito de recorrer ao teletrabalho sempre que:
a) A atividade desempenhada o permita;
b) O trabalhador tenha filhos com idade até 3 anos, a atividade desempenhada o permita e o empregador disponha de recursos para o efeito;
c) Ambos os progenitores reúnam as condições para o exercício da função em teletrabalho, desde que exerçam a atividade em teletrabalho em períodos sucessivos de igual duração num prazo de referência máxima de 12 meses e tenham filhos até aos 8 anos de idade (esta possibilidade não se estende aos trabalhadores de microempresas);
d) Se tratem de famílias monoparentais ou em que apenas um dos progenitores reúna condições para recurso ao teletrabalho e tenham filhos até aos 8 anos (esta possibilidade não se estende aos trabalhadores de microempresas);
e) Ao trabalhador tenha sido reconhecido o estatuto de cuidador informal não principal, desde que a atividade o permita e o empregador disponha de meios para o efeito. Neste caso, valerá apenas por um período máximo de 4 anos seguidos ou interpolados.
Estabelece-se, ainda, que as reuniões de trabalho à distância e as tarefas que devam ser realizadas em tempos precisos ou juntamente com outros trabalhadores, devem ter lugar no período do horário de trabalho e ser agendadas, de preferência, com 24 horas de antecedência.
Sempre que se realizem reuniões, ações de formação ou outras situações que exijam a presença física do trabalhador, está este obrigado a comparecer devendo ser convocado com, pelo menos, 24 horas de antecedência.
Os custos de deslocação que excedam o custo normal do transporte entre o domicílio do trabalhador e o local em que normalmente prestaria trabalho são suportados pelo empregador.
É proibida a conexão permanente, durante a jornada de trabalho, por meio de imagem ou som e o controlo da prestação de trabalho deve respeitar os princípios da proporcionalidade e transparência.
Por razões de segurança e saúde no trabalho, está vedada a prática de teletrabalho para atividades que impliquem o uso ou contacto com substâncias e materiais perigosos para a saúde ou integridade física do trabalhador (exceto se as instalações a utilizar estejam certificadas para o efeito).
Deve o empregador promover a realização de exames de saúde no trabalho antes da implementação do teletrabalho e exames anuais para avaliação da aptidão física e psíquica do trabalhador para o exercício da atividade. Por sua vez, deve o trabalhador facultar o acesso ao seu domicílio profissional pelos profissionais a quem incumba a avaliação e o controlo das condições de segurança e saúde no trabalho, mediante prévio acordo e que deverá realizar-se entre as 9 e as 19 horas.
Prevê-se um dever de abstenção de contacto, pelo que o empregador deve abster-se de contactar o trabalhador no período de descanso (exceto nos casos de força maior), sob pena de constituir contraordenação grave. O exercício do direito de descanso pelo trabalhador nestes moldes não poderá implicar qualquer tratamento menos favorável por parte do empregador, nomeadamente face às condições de trabalho e progressão na carreira.
Relativamente às alterações que se verificam face ao regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais, passa também a ser considerado acidente de trabalho aquele que se verifique no local e no tempo de trabalho e produza direta ou indiretamente lesão corporal, perturbação funcional ou doença de que resulte redução na capacidade de trabalho ou de ganho ou a morte, considerando-se como local de trabalho aquele que conste do acordo de teletrabalho.
Por fim, estender-se a aplicação do novo regime jurídico do teletrabalho à Administração Pública central, regional e local, o qual deverá ser aplicado com as necessárias adaptações.
A leitura deste resumo não dispensa a consulta e leitura do diploma legal em causa no Diário da República.